24/03/2008

DA (des)EDUCAÇÃO III

Vamos lá então organizar as ideias e responder às questões que me colocas, não só tu, como o nosso amigo Firmino (professor, amigo e meu ex-colega de turma em Évora) que muito tem enriquecido este blogue.

Antes de mais sou obrigado a pedir desculpa a quem nos lê pelo que propus no meu primeiro post sobre esta questão. Estava a ser sincero e só no dia seguinte soube que também eu havia sido rasteirado pelo ministério da educação. Já não há expulsões, logo não as posso propor. Mas posso criticar veementemente esta medida, não que a expulsão fosse importante em si, mas como medida dissuasora sempre teve algum peso. Por outro lado, e como os tempos avançam, o tipo de expulsão que propunha não era mandar os miúdos para casa a seu bel prazer, mas sim colocá-los a fazer trabalho comunitário até ao final do ano lectivo e se possível que esse trabalho fosse realizado dentro do próprio estabelecimento de ensino para que servisse de exemplo a outros... Não sou de todo mestre em pedagogia, mas "obrigar" os alunos a passar, ter medo de os suspender, ter medo dos pais dos mesmos e tudo isto com o aval do governo é sem dúvida uma aberração. Não descupabilizando a professora, hoje em dia os docentes têm que ser verdadeiros super-homens e mulheres para aguentar este quotidiano (ainda por cima aumentaram-lhes a idade da reforma).

Quanto à operação de cosmética de que falas (para Bruxelas ver) só posso concordar contigo e não é só por estes casos já batidos e rebatidos. Lembro apenas outros dois exemplos do absurdo em que tudo isto se está a tornar: -Novas oportunidades, não tendo, à priori nada contra quem quer aprender hoje por não ter tido tempo ontem, parece-me estranho que haja pessoas que levem 3 anos a estudar a sério para fazer esses mesmos 3 anos e outras que através deste programa e com meia dúzia de horas fiquem com as mesmas equivalências. E lá está meu irmão Bruxelas vê que em Portugal toda a gente tem o 12ºano, e nós por cá vemos uma cambada de gente cada vez mais impreparada...
-Segundo e flagrante exemplo de que não me consigo esquecer, pois ultrapassa tudo o que há de razoável: Lembras-te quando o ano passado ou há dois anos no exame nacional de Português os erros ortográficos não contavam para baixar a nota? Que bela média ostentámos... Quantos analfabetos tiveram médias superiores a alunos de outros anos só para Bruxelas ver... Como vês quanto a isso nada a dizer. Estamos juntos.

Há contudo uma discórdia ainda. Quando falas no Vasco Pulido Valente (O Firmino também elogiou muito o seu texto) dizendo que os miudos em casa de certeza que não fazem a mesma coisa... Desculpa Pedro, mas é um pouco demagógico. Tu em casa também não o fazias, nem eu, nem a maoiria dos adolescentes. É completamente diferente uma relação familiar com uma relação aluno(a)/professor(a) e como tal compará-las não pode fazer nenhum sentido. Olha se eu fizesse em casa algumas coisas que sabes que fiz na escola??? Não vou por aí. Quanto ao texto do VPV concordo com quase tudo, mesmo sendo um texto que diz muito pouco, contudo não posso calar o que me faz mais confusão: Confundir autoridade com uso da força "porque não acredito que ela goze em casa da impunidade de que goza na escola. Na escola não lhe podem responder bofetada a bofetada".

Quanto às restantes questões que me foram colocadas vou tentar ser mais sintético.

O que é que eu faria numa situação daquelas? Não sei. Sei que aquilo não se passaria daquela forma como sei a forma como costumo lidar com telemóveis ou bilhetinhos... E se num bairro problemático num contexto extra-curricular te apontassem uma faca (aconteceu-me há 3 anos) que farias? Ninguém sabe, nem eu até ter feito o que fiz, e isto para te responder a outra questão, não há nem pode haver curso nenhum( superior ou não) para ensinar a lidar com este tipo de questões. Em primeiro lugar, porque não há duas situações iguais, e em segundo, porque duas pessoas diferentes não podem nem sabem agir da mesma forma. Não me parece de todo que isto se possa aprender. Quanto a aprender-se teorias do Rosseau não vejo nenhum mal nisso, antes pelo contrário, não querendo ir por aí alguém acredita que há bons e maus como nos filmes classe B e , havendo, alguém acredita que já se nasça assim? Somos todos um produto do que nos rodeia e o máximo que podemos fazer é tentar tornar o mais harmonioso possível o que está à nossa volta, principalmente se estamos numa escola. Ainda na indisciplina, é evidente que a avaliação dos professores não vai responder a este problema, mas também não me parece que seja esse o objectivo principal. O seu a seu dono. Bem ou mal o que responde a este problema é a avaliação dos alunos e para que tal seja bem feita é bom que seja feita por professores competentes.
Não conheço bem os critérios que querem aplicar na avaliação dos professores e posso até discordar de uma série deles, mas sei , pelos muitos professores que conheço e dos muito que tenho ouvido que os professores não estão contra o facto de serem avaliados, mal seria se assim fosse. Penso é que deve ser uma avaliação com cabeça, tronco e membros e só começar no próxi mo ano lectivo, mas é uma reforma que tem que avançar e que não deve meter medo à classe.Quem não deve não teme. E se pensares fora do ensino oficial, tanto em escolas profissionais, privadas, ou outro tipo de ensinos (por exemplo a jovens problemáticos) essa avaliação já existe e com critérios que variam de estabelecimento para estabelecimento. Já leccionei em escola profissionais e já me aconteceu mais que uma vez ir ao conselho executivo por falhar determinada norma. Nunca me tirou o sono nem nunca fui para a rua por isso, pois o trabalho era credível. Se por algum acaso se tiver medo de pais, primos, irmãos ou avós não se mostra nem se aceitam ameaças como "vou dizer à minha mãe para lhe dar negativa", pois caindo neste erro estamos perto do precípicio da professora do Porto. A autoridade ainda está em quem lecciona e é quem lecciona que dá notas. O que é que acontecerá quando o abandono escolar e as notas fizerem parte da avaliação dos professores? Espero que nada de extraordinário. As notas, em príncipio devem bater mais ou menos certas com as notas dos exames, ou seja, professores que comecem a pensar em dar notas pensando primeiro nas suas podem ou devem ter problemas. Quanto ao abandono escolar... Desde que não recaia sempre sobre o mesmo(a) professor(a)...
É pelo menos com isto que eu conto. Ou será que estou louco?

3 comentários:

Fir disse...

Amigo Nuno,

obrigado por teres respondido às minhas questões. Acho que não fui bem compreendido e portanto gostava de esclarecer aqui algumas coisas:

- Em relação à avaliação dos professores, tenho todo o interesse nela, se for feita com pés e cabeça. Como tu sabes, nalgumas escolas do nosso país, há professores de Oficina de Teatro sem qualquer formação, experiência ou competência na área. Portanto, tenho todo o interesse em ser avaliado, desde que isso sirva para reconhecer o meu trabalho e, porque também tenho as minhas falhas, para o melhorar; acrescento que a avaliação também deveria servir para compensar monetariamente os professores bem classificados; com isto, melhorar-se-ia o sistema de ensino, pelo menos no que aos profs. diz respeito;
- Falei no Rousseau a título de exemplo, o que eu critico é o divórcio entre a formação de professores e a realidade das escolas; estou plenamente convencido que anda por aí muita gente a formar professores que não faria um bom trabalho nas escolas para onde os seus alunos irão
- Não me parece justo avaliar a professora do vídeo pela maneira como reagiu num momento em que estava sob stress;
- Não me deixei intimidar pela aluna que "ia fazer queixa à mãe"; já não me lembro como reagi, mas devo ter-me rido na cara dela; o que me preocupa são as ideias que entram na cabeça dos miúdos e que só os prejudicam; os alunos têm de perceber que o seu sucesso também depende do trabalho deles e não apenas das condições das escolas ou do mérito dos professores
- O sistema que o ME propõe incentiva ao facilitismo, especialmente nas disciplinas que não estão sujeitas a exame externo; nas outras, se houver discrepâncias, o ME baixará a dificuldade dos exames ou os critérios de correcção (como aconteceu com os exames de Português)
- os professores não podem ter medo de reprovar os alunos que não sabem nem de castigar (sem abusos, obviamente) os que têm mau comportamento
- é certo que é normal os adolescentes desafiarem a autoridade e o professor deve estar ciente desse facto; mas o que viste no vídeo não foram alunos a desafiar a autoridade do professor; os alunos ERAM a autoridade; e isso já não é nada normal
- não concordo em tudo o que disse VPV; mas gostaria de sublinhar os últimos parágrafos, qualquer coisa como isto: "se houvesse justiça, estaríamos a avaliar os ministros da Educação que desde Roberto Carneiro (homem nefasto) têm vindo a diminuir a autoridade dos professores"

Nuno Góis disse...

Grande Firmino
Como vês estamos de acordo em quase todos os pontos.
Quanto ao que escrevi não o vejas de todo como critica à forma como trabalhas, apenas utilizei coisas que escreveste, porque sei serem preocupações de muitos professores. Penso que nunca pessoalizei, se passou essa ideia peço desculpa. Quem seria eu para te estar a dar lições. Estamos apenas a discutir no melhor dos sentidos do termo ou, se preferires, a reflectir.
Quanto à ultima frase do VPV completamente de acordo.

Aquele abraço e volta sempre, pois é um prazer ter-te aqui a reflectir connosco.
Até breve...

Fir disse...

Amigo Nuno,
é óbvio que nunca entendi nenhum comentário teu de forma pessoal.
É natural que os amigos por vezes não estejam de acordo e isso só enriquece a liberdade de expressão.
Um abraço.