Sei razoavelmente do que falo, já o vi com os meus próprios olhos nos inícios dos anos 90, tempos em que a rádio era bastante melhor que no presente. Resumindo, as listas de canções a tocar chegavam em CD' s impessoais em formato de colectânea. Era aquilo que se devia ouvir. Caso alguém quebrasse a regra entraria o director pela sala adentro, a dizer algo do género "que é esta merda. Quem é que vos deu autorização..."?. Claro que um director com as suas contas a pagar fazia depender o seu lugar da vassalagem ás majors e aos interesses financeiros da sua empresa. Por estas e por outras e como o povo é que manda, as poucas rádios que hoje ainda sobrevivem com um mínimo de bom gosto, qualidade, de senso e de dignidade contam-se pelos dedos de meia mão.
E se pensam que com a obrigação de haver uma quota de música portuguesa, ao menos se poderiam pôr no ar músicos nacionais de jeito, pois tirem vocês o cavalinho da chuva. Agora mais do que nunca temos em doses cavalares EZ Especial, Fingertips, João Pedro Pais, Pedro Kimba... Todos juntos em uníssono, a massacrar-nos a toda a hora numa rádio perto de si. Nos cafés, nos cabeleireiros, nas agência de viagens, nos escritórios, nas paragens de Metro. Como alguém já escreveu na blogosfera - o "ruído insuportável do entretenimento".
É pouco dizer que em relação à televisão, a rádio conseguiu o feito de transformar-se de alternativa saudável a produto inofensivo. Com o cabo a televisão reformulou-se. Quem quer tem consoante o seu gosto noticias, história, ciência, filmes, comédia ou futebol. A rádio em vez de se reiventar perdeu relevo, dimensões, perdeu gente, perdeu personagens e só se diversificou na internet. Não traz nada e não acrescenta nada.
Reparem que não cito os programas de informação, as entrevistas e os debates. É a música que aqui me interessa. Sei que existem óptimas pessoas e excelentes profissionais de rádio em Portugal. Alguns que gosto bastante. Uns lá conseguem alguma autonomia nos seu trabalho, criando algo que é seu. Outros simplesmente não merecem os chefes que têm. Têm sonhos e são bons naquilo que fazem. Gostavam de poder escolher algumas músicas para tocar, de dar o seu gosto a quem o ouve, mas em vez disso, têm de colocar no ar as playlists. Puta que pariu para as playlists. Peço desculpa, mas a rádio em Portugal bateu no fundo. Tornou-se para mim e para muitos simplesmente insuportável. O problema não é só nosso. Em baixo Bruce Springsteen queixa-se do mesmo: is there anybody alive out there?
5 comentários:
Concordo plenamente. E se não se fala mais sobre isso é porque, infelizmente, as pessoas já se habituaram a não ligar mais a esse fabuloso meio de comunicação que já foi e pode continuar a ser a rádio, mas que, tristemente e como o dizes, hoje não o é...
blockbusters musicais exemplo da sociedade actual.
As pessoas esquecem-se. Se calhar de tanto chafurdarem na porcaria deixaram de lhe sentir o cheiro. E é pena porque as rádios podiam ser muito boas. Ou pelo menos bem melhores que as que temos. É daquelas coisas que faria se ficasse podre de rico - criar uma rádio. Se calhar duas ou três...
O dinheiro manda e para se vender publicidade é necessário ter audiência.
Infelizmente é assim e nem chego a achar que as pessoas têm mau gosto. Simplesmente não têm gosto e vão atrás das modas ou das músicas das quais se deve gostar (ou seja, as músicas que os outros gostam).
Pode-se falar inclusivamente numa estandartização da música, associada à afluência directa de público, aka "audiências". O Pop e o Rock Light de 3 minutos e meio em doses bi-horárias afastam muita gente que eu conheço das rádios. Eu próprio só ouço notícias e relatos de futebol, para além de um ou outro programa de discussão na Antena 3.
A questão das quotas esbarra na mediocridade dos nossos artistas mais mediáticos. Eu próprio tenho alguma alergia à música portuguesa e não tenho problemas em afirmá-lo.
Totalmente de acordo, mais até com aquela das pessoas nem sequer terem gosto e irem atrás das modas, se calhar até seria preferível que tivessem mau gosto. Talvez as humanizasse um pouco. De resto, a rádio tem mais que ver hoje com tele-marketing do que com si própria, passe a ironia...
Dantes ainda havia os programas de autor. Um indivíduo com um gosto bem definido passava as músicas que achava estarem na vanguarda. Entenda-se por vanguarda artistas que acrecentassem algo de novo ou cuja qualidade intrínseca merecia a sua atenção.
Hoje a música banalizou e a malta vai atrás do que as editoras querem. Mas quem é que manda nas rádios afinal?
Um fã genuíno de Tony Carreira merece mais respeito do que uma pessoa que só compra os cds que estão no top.
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